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sábado, 27 de novembro de 2010

Coragem, covardia e medo na linha de fogo da guerra no Rio de Janeiro

26 de novembro - A Vila Cruzeiro está agora sob o comando da polícia. Os traficantes fugiram, possivelmente para o Complexo do Alemão. Foto: AP

O barulho das balas quando rebatem no asfalto nada se parece com o estrondo de tiros quando ouvidos de longe. É muito mais baixo, rápido e imensamente mais apavorante. Encostados contra as paredes, os soldados do Grupo de Infataria Paraquedista do Exército apresentavam semblante de aparente tranquilidade. Experimentados em operações de paz no exterior, eles pareciam acostumados ao que estava acontecendo: uma guerra.

Bem diferente dos soldados, os homens, mulheres e crianças que se espremiam em um bar na esquina das ruas Paranhos com a avenida Itararé, no Complexo do Alemão, agonizavam a cada disparo. O refúgio se situava entre dois morros: Favela da Grota e Morro do Adeus, duas bases da facção de traficantes que está desde quinta-feira encurralada nas favelas do Alemão.

O relógio marcava 16h20 quando a notícia de que uma mulher havia sido ferida em uma residência próxima chegou até o bar. Nenhuma ambulância poderia se aproximar de onde somente os tanques de guerra blindados usados pelo exército circulavam. Luiza de Moraes, 61 anos, teve que aguardar aproximadamente 20 minutos até que um caveirão da Polícia Militar encostasse no portão de sua casa para fazer o resgate. Crivado por balas, o veículo deixou o local e conduziu a vítima até o hospital Getúlio Vargas, na Penha.

Em um momento como esse, a coragem de uma mãe pode ser comprovada. Uma moradora do Complexo do Alemão envolvia seu filho de 7 anos nos braços enquanto falava com o marido ao telefone: "Não venha. Está perigoso. Não tem o que fazer. Tem que esperar".

Em um momento como esse, a coragem de um pai também pode ser comprovada. Em menos de dez minutos um homem chegou ao bar para se juntar à mulher e ao filho. Os três aguardaram uma trégua no tiroteio e seguiram até suas casas.

Diferente é a audácia dos criminosos que coloca famílias em risco ao atirar contra homens do exército treinados e fortemente armados. O general de brigada Fernando Sardenberg, à frente dos 800 paraquedistas equipados com fuzis Para-Fal 762, com alcance de 600 m, havia dado o panorama da operação: "não viemos para atacar. Temos que segurar posições. Atiraremos apenas se precisarmos nos defender". E lá estava o Exército brasileiro, dando tiros de fuzil em pleno território nacional, em legítima defesa.

Horas antes, repórteres puderam testemunhar outra cena de audácia e covardia. Uma nuvem negra de fumaça apareceu na rua Luiza Vale, no bairro Maria da Graça. Bandidos fizeram com que sete passageiros e um motorista abandonassem o ônibus da empresa Lourdes, que fazia o trajeto Penha-Olaria, e atearam fogo no veículo. Em estado de choque, o motorista descreveu o momento de pânico: "eles chegaram atirando. Gritavam para descer, mas quase não deu tempo. Achei que fosse morrer". Dez minutos foi o que bastou para o veículo se transformar em uma carcaça cinza.

Por volta das 10h30 da manhã, policiais federais ficaram cara a cara com um grupo armado de traficantes da Favela da Grota. Os criminosos exibiam seus fuzis e provocavam: "você vai morrer". "Então desce, covarde", revidavam os policiais. Houve troca de tiros. Mas nem os policiais subiram, nem os bandidos desceram.

A estratégia da polícia e do Exército nesta sexta-feira foi de cercar a área. "Fechamos as 44 vias de acesso às favelas do Complexo do Alemão. A não ser em quatro vias essenciais aos moradores, ninguém mais entra nem sai", afirmou o general Sardenberg. O final de semana vai começar com as forças especiais da Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Federal, Exército e Marinha do lado de fora e traficantes fortemente armados do lado de dentro. Tudo isso diante de uma população de mais de 62 mil pessoas, que habitam um dos maiores complexos de favelas do mundo. O Rio de Janeiro, mais do que nunca, está em guerra.

Desde o início dos ataques, pelo menos 36 pessoas morreram nos confrontos com a polícia.

Violência
Os ataques tiveram início na tarde de domingo, dia 21, quando seis homens armados com fuzis abordaram três veículos por volta das 13h na Linha Vermelha, na altura da rodovia Washington Luis. Eles assaltaram os donos dos veículos e incendiaram dois destes carros, abandonando o terceiro. Enquanto fugia, o grupo atacou um carro oficial do Comando da Aeronáutica (Comaer) que andava em velocidade reduzida devido a uma pane mecânica. A quadrilha chegou a arremessar uma granada contra o utilitário Doblò. O ocupante do veículo, o sargento da Aeronáutica Renato Fernandes da Silva, conseguiu escapar ileso. A partir de então, os ataques se multiplicaram.

Na segunda-feira, cartas divulgadas pela imprensa levantaram a hipótese de que o ataque teria sido orquestrado por líderes de facções criminosas que estão no presídio federal de Catanduvas, no Paraná. O governo do Rio afirmou que há informações dos serviços de inteligência que levam a crer no plano de ataque, mas que não há nada confirmado. Na terça, a polícia anunciou que todo o efetivo foi colocado nas ruas para combater os ataques e foi pedido o apoio da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para fiscalizar as estradas. Foram registrados 12 presos, três detidos e três mortos.

Na quarta-feira, com o policiamento reforçado e as operações nas favelas, 15 pessoas morreram em confronto com os agentes de segurança, 31 foram presas e dois policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) se feriram, no dia mais violento até então. Entre as vítimas dos confrontos, está uma adolescente de 14 anos, que morreu após ser baleada nas costas. Além disso, 15 carros, duas vans, sete ônibus e um caminhão foram queimados no Estado.

Ainda na quarta-feira, o governo do Estado transferiu oito presidiários do Complexo Penitenciário de Gericinó, na zona oeste do Rio, para o Presídio Federal de Catanduvas, no Paraná. Eles são acusados de liderar a onda de ataques. Outra medida para tentar conter a violência foi anunciada pelo Ministério da Defesa: o Rio terá o apoio logístico da Marinha para reforçar as ações de combate aos criminosos. Até quarta-feira, 23 pessoas foram mortas, 159 foram presas ou detidas e 37 veículos foram incendiados no Estado

Na quinta-feira, a polícia confirmou que nove pessoas morreram em confronto na favela de Jacaré, zona norte do Rio. Com isso, desde domingo, o número de mortos na onda de violência nas ruas do Rio de Janeiro e nas cidades da região Metropolitana chegou a 32. Durante o dia, 200 policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) entraram na vila Cruzeiro, no Complexo da Penha, na maior operação desde o começo dos atentados. Os agentes contaram com o apoio de blindados fornecidos pela Marinha. Quinze pessoas foram presas ao longo do dia e 35 veículos, incendiados.

Durante a noite, 13 presidiários que estavam na Penitenciária de Segurança Máxima de Catanduvas, no Paraná, foram transferidos para o Presídio Federal de Porto Velho, em Rondônia. Entre eles, Marcinho VP e Elias Maluco, considerados, pelo setor de inteligência da Secretaria Estadual de Segurança, diretamente ligados aos atos de violência ocorridos nos últimos dias. Também à noite, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, assinou autorização para que 800 homens do Exército sejam enviados para garantir a proteção das áreas ocupadas pelas polícias. Além disso, o secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, anunciou que a Polícia Federal vai se integrar às operações.



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